RELATORAS CONVIDADAS

As relatoras oficiais são um conjunto de pessoas (senhoras!) que foram convidadas pela organização do evento para que - ao longo dos 3 dias - sintetizem a sua opinião sobre cada palestra assistida e partilhem os seus textos. À medida que os textos vão chegando serão colocados por baixo do nome de cada uma.

1. JULIA BURGER

Julia Burger - Apresentação e síntese das conduções das mesas redondas



15/12/11 – RELATO ESCRITO POR JULIA BURGER
ÉTICA | EQUIPAS
Apresentação e síntese das conduções das mesas redondas. Elisa Marques, Fátima Alves e Rosário Azevedo

1. Rosário Azevedo (ICOM-CECA)
Nas duas mesas não houve conclusões. Houve muito debate. E um processo muito aberto: o de mediação.
Nos fez pensar que ainda há muito por fazer nesse campo. Existe muito pouca bibliografia nesse assunto.
Ainda há muito para conversarmos, publicarmos, etc.
Tentamos alcançar um sinónimo para a palavra mediador e pensamos em facilitador o que sugere que o processo, a compreensão é dificil.
Pensamos que também o termo professor não substitui o mediador.
São campos próximos, mas distintos.
O professor ou educador também não é um mediador porque vive em um outro campo.
Discutimos sobre o papel do mediador como intermediário, mas consideramos que não precisa intermédio entre obra e público.
No âmbito da arte contemporânea a participação do sujeito em relação à obra é fundamental.
Surgiu também o termo “catalisador”, pensando na reação química, na relação entre mediador e público.
A ética tem que estar em todo o processo e as questões éticas tem que estar presentes em todos os momentos.
Isenção: será que o mediador tem que estar isento?
Surgiu na fala de uma pessoa de que se o mediador está no meio, está envolvido no processo, ele não tem como estar isento, o que não quer dizer que ele tenha que manipular.
Carácter dialético: falta de isenção e processo emancipatório.
Síntese final: mediador vai direcionar e ajudar no processo do público fazedor de circunstâncias.

2. Elisa Marques
Em nome das artes ou em nome dos públicos? Questões da Equipa, questões dos 3 Es. Equipa – Ética – Erro, numa equipa deve haver Ética. Há projeto? Venha a Equipa.
O conceito de público é igual ao de espectador?
O projeto é uma construção, o fazer de algo: construção, imprevisibilidade, excentricidade, intencionalidade, desafio.
O projeto não era uma linha reta nem várias atividades, é uma intenção. Há uma finalidade, é um somatório.
Equipa: pessoas, objetivo, saber(es), multidisciplinar.
Conjunto de pessoas em determinado contexto, com um objetivos comum. Com diversos saberes que potenciam o conhecimento.
Mediação: intrapessoais, instrumentais, simbólicos.
Não separamos a mediação cultural da escola. Ambos são mediação cultural pois a cultura está dentro da própria escola.
Instrumentais: o que damos aos outros.
Simbólicos: conjunto de meios internos que as pessoas mobiliza para pensar em outros mundos.
Mediação: atingir conhecimentos maiores. Conjunto de circunstâncias para que a pessoa possa ir e vir entre si e o mundo.

Motivação da equipa:
- regras claras (normas)
- autonomia
- aprender
- aceitar o erro
- prazer e entusiasmo (alegria)
- acreditar
- ouvir o outro

Liderança
Há sempre um líder? O líder é um nato?
Categorias de líder: autoritário, laissez-faire, democráticos.
Às vezes tem que ser ou fazer cada um desses papéis.
Coordenar – desenvolver – planear – organizar – avaliar – envolver.
Louvar as pessoas, haver outros mundos, outras distâncias.
Nem em nome das artes, nem em nome dos públicos: em nome da educação.
Questão da educação como um processo. Só uma atividade complexa consegue ser criadora.

3. Fátima Alves (GAM)
GAM (único grupo de pessoas com as quais podemos perceber o que nos falta fazer no nosso espaço).
GAM – grupo de pessoas que trabalhavam em ou para museus.
Faz um convite para que mais pessoas compartilhem o programa.
O GAM se preocupa com o público que não visita os museus.
Afinal o que estamos a fazer para esses públicos.
Quantos pensam em pessoas com deficiência.
Fomos 12 pessoas nos dois dias.
Na primeira mesa a maioria das pessoas vinha para ouvir.
Estar com as pessoas com necessidades especiais, nos lugares em que elas estejam.
Temos de aumentar a comunicação com essas pessoas.
Criar, ir para outro terreno.
Conseguir com que eles venham, que esse pública realmente esteja nos museus.
No fundo é quase vender um produto e conseguir que essa pessoa compre um produto.
Estamos desenvolvendo um caminho para que as pessoas que já desistiram de ir a um museu porque tiveram frustração, passe a confiar novamente nessa importância.
Acessibilidade cultural: qualquer pessoa tem que ter acesso a espaços culturais.



2. DIANA RAMALHO
  
Workshop da Sofia Neuparth e da Graça Passos
 

Foi a segunda sessão com a Sofia e a Graça e à semelhança do que aconteceu no dia anterior, a rotina foi quebrada e a intimidade foi criada e estabelecida com todos no palco. Não houve já nenhuma hesitação, todos sabíamos que com esta dupla tudo acontece naquele espaço.
Decidi fazer parte deste acontecimento, em vez de ser mera observadora. Caminhámos pelo espaço com uma almofada na mão, de repente estamos a trocar de almofadas, estamos a tirar almofadas ou então a dar almofadas a quem não tem. Foi um momento de descontração, quase esquecendo onde estamos e com que estamos.
Lá parámos e em círculo retomámos a metáfora da “sopa”. Partilhámos opiniões, experiências e vivências. Ficaram questões em aberto, mas o importante é isso mesmo, reflectir sobre algo sem termos que ter a resposta. Ou será que temos de ter respostas para todas as perguntas? Que necessidade é esta de termos sempre respostas? Há espaço para o não saber? E isso significa que não sabemos? O não saber abafa o saber? Há espaço para o começar? E para começar temos que já ter terminado? Conseguimos manter a nossa flexibilidade, a nossa energia? Ou a rotina e o estático impõem-se?
Este workshop foi em ambos os dias um espaço de partilha mas também de instropecção e de questionamento. Como a Sofia disse o nosso corpo faz coisas incríveis, de repente basta dar um salto que o nosso corpo já está diferente, com mais células a circular. Estamos sempre a mudar.
Terminámos em grande com a dinâmica da espiral, em que o importante é percepcionar algo que não pode ser visto e para isso apenas precisamos de saber escutar.

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Diana Ramalho - Comentário Workshop Sofia Neuparth e Graça Passos 1ºDia
Comentário Workshop Sofia Neuparth e Graça Passos (1ºDia)

O workshop da Sofia Neuparth e da Graça Passos começou com a apresentação de um conjunto de imagens (fotografias de interação com o público e com o espaço). Em silêncio os participantes foram convidados a observar estas atmosferas.
Foi pedido para subirem ao palco e para caminharem pelo espaço, conversar com as pessoas que iam encontrando ao longo deste percurso. Houve quem decide-se, como eu, permanecer apenas como mero espectador da acção que decorria no palco, foi como se estivéssemos a assistir a um espectáculo/performance. Este momento fez com que fossem quebradas uma serie de barreiras, de repente deixa de existir público somos todos participantes de algo, existindo uma intimidade de que outra forma não teria acontecido.
Em termos visuais, era notório o aglomerado de pessoas no palco, pois estas acabavam sempre por circular pelos mesmos locais. Parecia ser mais confortável, mais fácil caminhar com os outros do que percorrer alguns espaços mais vazios, o melhor era seguir a maré.
De seguida, a Sofia Neuparth envolveu os participantes numa dinâmica em que estes tiveram que funcionar como um só. Era necessário estar com completa atenção aos outros, pois assim que um começasse a andar todos o teriam que fazer e assim que um parasse todos teriam que parar.
Foi dado aos participantes uma folha e um lápis e foi pedido para fazerem pares. Pelo espaço, dois a dois tiveram que caminhar ao mesmo tempo e parar em simultâneo. Sem dúvida, que este momento mexeu com os constrangimentos e desconfortos de termos que, de repente, estar em sintonia com uma pessoa que não conhecemos e que provavelmente nunca tínhamos visto. O que conversar nestas circunstâncias? O que dizer a uma pessoa que é uma desconhecida?
 Depois, ao pararem tinham que observar o que estava à sua volta e escrever na folha, algo simples e curto, relacionado com o que viam, ouviam, sentiam ou percepcionavam. Esta folha era depois trocada com o seu par, cada um lia o que o outro tinha escrito e caso um já estivesse a caminhar esta leitura teria que ser feita em movimento. De repente, deixamos apenas de caminhar com um pessoa que não conhecemos e estamos também a partilhar ideias e sensações.
Outro momento marcante deste encontro foi, sem dúvida, quando a Sofia pediu ao grupo para cozinharem uma “sopa”. Quais os ingredientes desta sopa? Como fazer? Como se começar? Por onde se começar?
Momento de desconforto, pois não existe uma forma fixa de estar, o corpo deve estar sempre passível a trocar de lugar, a não se deixar estar confortável. Até porque não existe um porquê comum a todos, cada um de nós tem o seu caminho.
A Sofia deixou-nos algo para pensar relacionado com o conceito de deformação. Como é possível existir um encontro sem existir uma deformação? E quão pronto estamos para essa deformação?
E foi assim o primeiro dia, um início de conferência que brincou com constrangimentos e desconfortos.

Por Diana Ramalho 



3. ANA LEITÃO 

Ana Leitão - Comentário às conclusões apresentadas das mesas redondas sobre o Erro

Apresentação das conclusões de mesas redondas sobre o ERRO
Foi um privilégio assistir à apresentação das conclusões das mesas-redondas sobre o tema “erro”, por Maria Vlachou e Stela Barbieri: brilhantes e complementares sínteses, reveladoras de duas moderadoras muito bem preparadas mas também de trabalho de grupos muito qualificado.
Saliento à partida dois tópicos: o da necessidade de evitar que o erro acontecido (ou receado) seja paralisante do trabalho, tópico comum às conclusões apresentadas por ambas as moderadoras e um outro, o interessante conceito de Errância (o errante como aquele que se aventura), abordado nos grupos de Stela Barbieri.
Elenco agora outros pontos que me parece importante  reter:
Mesas-redondas com Maria Vlachou
- O erro está ligado ao processo, não necessariamente ao sucesso; é uma variável com que temos que contar.
- A paixão pelo trabalho executado pode desencadear erros, ao retirar distância crítica
- A detecção de um erro varia consoante se trabalhe só ou em grupo mas, no 1º caso, ainda que se possua um grande auto-controle, convem sempre pedir o feed-back de terceiros.
- Na prevenção de erros, sublinha-se a importância de equacionar à priori  vários cenários possíveis mantendo, não obstante, a abertura à novidade/imprevisto, com capacidade de improvisação; a cautela não deve apagar a necessária ousadia.
Mesas-redondas com Stela Barbieri
- “Não se fazem C.V.s com os nossos erros, só com as nossas glórias”…
- O erro tem a ver com expectativas
- O erro tem dupla potência, positiva e negativa
- É importante distinguir entre julgamento (com o que tem de apriorismos) e avaliação
- Errar não é falhar, falhar acontece se nada se faz mais
- Importante amadurecer o conceito de “errância”, que não é linear
- O erro pode ser possibilidade de aproximação - se o grupo a quem se expõe não é cruel e não se aproveita de quem se expôs ao contá-lo.


E com esta me fico.
Feliz Natal para todos!
Ana Leitão

P.S.- Talvez não saibam mas a ReCose construiu, no final desta apresentação, uma teia de afectos lindíssima. Dizem que a ideia partiu de um eventual erro…


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Debate com John Falk e Maria Vlachou

“A ponte é uma passagem
... p’rá outra margem (bis)
um desafio, pairando sobre o rio...”
(Jafumega, in “Ribeira”)

E vem isto a propósito de a metáfora da ponte, para representar a relação do museu com o(s) seu(s) público(s) ter sido, de muitas e variadas formas, dissecada quase até à exaustão.

Bastante consensual (creio) nessa abordagem foi a verificação de que numa ponte “as fundações são muito importantes em ambas as margens mas passamos muito tempo e com muitos experts a planear a fundação do lado institucional mas quase nenhum tempo e com muito menos recursos o fazemos do outro lado - do visitante” (Falk).

Stela Barbieri desdramatizou esta metáfora com uma frescura muito própria centrando a questão existencialmente nas pessoas (dos potenciais visitantes aos mediadores). E na sua voz melodiosa, interpelou John Falk: “Se eu quiser dançar consigo tento adaptar-me, se quiser abraçá-lo, também”. Adorei, confesso. Talvez por estar constipada e não estar dada a grandes voos.

Pontos tão ou mais importantes? Claro que os houve, mas ou me arrisco a fazer um comentário como o de ontem em que deixo todos de língua de fora com o esforço de não preterir uns em detrimento de outros, ou terão que se contentar hoje com isto.

“… A ponte é uma miragem.” ?

A ponte ideal talvez, mas há laços, em construção permanente, nos nossos trabalhos com e como públicos, lembrou Susana Gomes da Silva, que sugeriu a existência de uma outra ponte a construir, interna, nas equipas dos próprios museus.

Falk, que introduziu a dita metáfora, não obstante uma resposta menos feliz a uma intervenção que sonhava com a mudança do mundo -“essa é a sua agenda, não a do visitante”- , apresentou várias sugestões simples e perfeitamente exequíveis para mediadores ( e sem gastos em tempo de crise):

. “podemos perguntar aos visitantes:

- tenho estes tópicos para tratar, quais vos interessam mais? - ou - estava a pensar em 2 ou 3 abordagens, qual preferem?”

Vêem como a minha expectativa de escrever pouco se está a gorar? É que, lembrei-me ainda, falou-se imenso de motivações, dos visitantes, dos não visitantes e de como estas podiam ser categorizadas para se chegar a uma melhor compreensão dos mesmos. E de que, não sendo essa a função intrínseca dos museus (atender às expectativas e necessidades das pessoas) , dificilmente estes sobreviverão se não as tiverem em conta.

Termino: não sei bem porquê mas associo o espaço de debate de ontem à contemplação e este à acção (mas já os beneditinos suplantavam as dicotomias com o “Ora et labora”). Eu preferi a contemplação de ontem mas já que hoje senti mais a acção, vamos a isto: que tal ouvir agora a música?

http://www.youtube.com/watch?v=ljtw2TbhXzQ

Ana Leitão
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Ana Leitão - Comentário à palestra de Fernando Hernandez

“O tempo, esse  grande escultor” (Marguerite Yourcenar)
Comentário à palestra de Fernando Hernandez, por Ana Leitão
“A arte expressa relações, o nosso trabalho é permitir que relações  tenham lugar”- Fernando Hernandez alertava assim para os riscos de uma mediação desenvolvida como “colonização”.
O mediador, “trabalhador da cultura” deverá então ser um “criador de circunstâncias”, alguém disposto a criar “disponibilidade de encontro”, atendendo à arte como “estado de encontro”.
Deverá substituir o diálogo “comunicativo”com o público por um diálogo”analítico”, que tenha em conta as grelhas de leitura de quem participa numa visita.
Defensor de “projectos de trabalho”, mais do que visitas ou ateliês, Hernandez  apontou vários eixos norteadores desses projectos :
-  favorecer o desejo de aprender
- favorecer uma cultura “de escuta”, de diálogo
- fomentar a problematização, o questionamento e a meta reflexão
- proporcionar a construção de relações e associações
- permitir documentar (não como uma acumulação de informação)
e narrar
O trabalho educativo entendido como trabalho performativo e a afirmação da prática pedagógica como devendo estar indissoluvelmente associada à construção de identidade remataram esta verdadeira aula interactiva.
Mas foi uma resposta a uma questão levantada pela audiência relativamente às qualidades de um mediador, que fez vibrar as cordas da minha paixão pelo trabalho em serviços educativos:
Hernandez, num jeito indizível, respondeu:
- capacidade de escutar
- pôr-se no lugar do outro -empatia
- paciência
E foi sobretudo esta última qualidade, justificada com a constatação de que “há que dar tempo ao tempo”, que me deixou a ruminar por dentro…
“  10 anos depois uma pessoa compreendeu algo que eu havia dito”
A problematização foi num crescendo:
“o trabalho de mediação e seus resultados são dificilmente mensuráveis”…
“o tempo que estamos com um grupo é muito limitado”
A sessão da manhã terminou mas a ausência anunciada do projecto antimuseo , pela tarde, ofereceu-nos  “um prolongamento em exclusivo” de Hernandez.
“Não há nada mais prático que uma boa teoria” (Kurt Lewin)
Debate com Fernando Hernandez, comentado por Ana Leitão
Acreditem que raramente um debate flui tão espontaneamente e se auto-alimenta como este a que assisti à tarde, numa conversa que nascia de dentro, das experiências pessoais  dos intervenientes, e da postura sábia (gosto desta palavra e é tão raro poder usá-la!) deste mestre da escuta.
Tópicos, os mais diversos, a conversa, fantástica construção conjunta, sustentada por este “provocador de circunstâncias”:
- A escola entrou em força no debate, pela mão de Hernandez e de vários elementos da assembleia, que ponderaram o seu potencial transformador, tantas vezes manietado -“fugiu um anjo da escola, a imaginação pedagógica”-, a diferença na relação da comunidade (?) escolar com as obras de arte versus relação com os artistas vivos, as dificuldades sentidas por ou com professores…
- Os dualismos e generalizações associadas foram recusados: as escolas e museus propagam mais informação do que promovem a reflexão mas também existem situações de profunda construção partilhada de saber. Susana Gomes da Silva apontou aliás que em Portugal, existem muitas vezes 2 velocidades diferentes nos museus: por um lado o trabalho que é feito pela Instituição em si, e por outro, o de Serviços Educativos
- Sophia Neuphart reflectiu sobre o difícil equilíbrio , autêntica “ginástica”, entre a provocação de movimentos nas pessoas/comunidades e a escuta.
- Hernadez agarrou-me com exemplos da sua história de vida (como as narrativas de histórias de vida são importantes!): alunos universitários que escolheram como seu projecto de pesquisa com o Professor “ A experiência de silêncio na sala de aula”; alunos de ensino intermédio que escolheram dominantemente como tema de filmes de 3 minutos que iam construir, “Memórias dos avós”
- Interessantíssima foi a interpelação de outro elemento sobre a relação entre artistas e escolas correr o risco de reduzir os primeiros a narradores da sua obra, que suscitou também a ponderação de Hernandez de que também as crianças podem ser usadas pelos artistas, se estes apenas as utilizam como mão de obra para os trabalhos que eles projectam. A esse propósito distinguiu outras 3 situações:
- Artistas que fazem projectos seus para as crianças verem
- Artistas que fazem projectos pedidos pelas escolas
- Artistas que fazem projectos com as crianças
Isto pode passar-se perfeitamente nos museus, relativamente à postura que assumem com os públicos…
Para terminar, o que me “agarrou” neste debate:
A questão das narrativas:
Hernandez:
- “A arte é um conjunto de relatos”
- “Nós criamos a nossa identidade como narrativa”
- “Até a nossa percepção é interpretativa, não podemos percepcionar sem interpretar”
Professora  e mediadora:
- Narrativas, sim, mas existe também o mistério, o indizível…
Obrigada, Fernando Hernandez, obrigada todos!


 
4. FELISA PEREZ   

Felisa Perez - Comentário ao debate com Stela Barbieri e Ricardo Jacinto

Relato do debate com Stela Barbieri e Ricardo Jacinto. Moderação: Celso Martins
15.12. 16h15
Os dados estavam lançados. A mesa aguardava. O público atento.
Celso Martins questiona Stela Barbieri e Ricardo Jacinto sobre a relação entre Arte e Erro e como a “mediação”, de certa forma, pode estar no meio deste processo.
Celso Martins faz um breve enquadramento sobre como tratar o erro na contemporaneidade, visto que depois do século XIX, com as vanguardas, os artistas deixaram de seguir cânones para entrar em ruptura, transgredir. Será que a partir daqui o erro ganhou um novo sentido? Deu uma espessura heróica à arte da diferença? Há regras na arte contemporânea ou vale tudo? Como detectar o erro? Contra que norma uma obra pode estar errada? A ausência de erros é ausência de limites? O artista ficou “desamparado” por não haver um cânone? O artista pode errar sem saber porquê?
Ricardo Jacinto: A questão do erro é fundamental no processo criativo porque, de certa forma, existe uma aparente liberdade, onde qualquer coisa vale. Mas existe algo paradoxal: como nos reconhecemos no nosso trajecto, enquanto pessoas e no nosso trabalho. Reconhecemos o erro? Identifico e vejo como um erro se transforma em atrito. O erro serve como instante, é algo inesperado, obriga-te a afastares-te um bocadinho e veres o problema/questão que estás a tratar. Trabalho isso enquanto músico. Quando tocas um instrumento deparas-te sempre com os limites das tuas capacidades. Nos momentos de improvisação a questão do erro não se coloca. Aí é um beco. Até podemos provocar essa situação descontrolada e em que tens que lidar com isso. Isso acontece propositadamente.
Celso Martins: Introduzes isso? O erro pode ser uma possibilidade de variação?
Ricardo Jacinto: Pode. Pode acontecer se tiveres um grupo de pessoas que esteja a fazer improvisação e dás uma nova vida a isso.
Stela Barbieri: Na improvisação também tem margem de erro. E para mim a arte contemporânea também tem regras. São regras internas.
Celso Martins: Mas se cada um tem as suas regras internas, então não há regras.
Stela Barbieri: O erro, no meu trabalho, enquanto artista, tem parâmetros, existem regras internas, não estão socialmente estabelecidas. Cada artista tem as suas regras, dentro da sua poética.
Celso Martins: O erro pode ser detectado em função do resultado? A forma ou coisa em que aquilo resultou pode dizer-me que errei com o meu trabalho?
Stela Barbieri: Isso é da ordem do corpo e da mente. Cada situação tem alguns parâmetros, mas é também corpo. É uma percepção. De um som que não soa bem. Às vezes detecta-se no processo. A medida disso é a medida da nossa percepção. É subjectiva e objectiva ao mesmo tempo porque cada um tem o seu objectivo.
Celso Martins: A visão romântica da arte pressupõe que o público quase não intervém no processo. O artista pode desenvolver o seu processo sem pensar no público?
Ricardo Jacinto: É difícil. Depende desse conceito porque o público é muito diverso. Mas consegues identificar contextos. Conseguimos perceber que num determinado sítio as pessoas andam de determinada maneira, por isso vamos trabalhar com isso. O que tem valor é o contacto do público com determinado objecto, é o tipo de relação que cria com isso, o que constrói ao lidar com determinado objecto. O público é o objectivo do que se está a construir. Por exemplo, se eu fizer uma obra para uma pessoa, é para ela. No meu caso tento perceber bem se há alguma norma para o sítio para onde crio a obra. Mas interessa-me mais que um trabalho possa passar por vários sítios porque quando essa obra vai para outro lugar tem outra apropriação. Já consegui, por exemplo, que pessoas que não têm nada a ver com o mundo da arte se relacionassem com o meu trabalho.
Stela Barbieri: Não penso no público quando faço arte, embora trabalhe com público. Para mim todas as acções são criação. Fazer educação também é fazer trabalho de criação. Curadoria também, escrever um texto para um jornal também. Não penso na especificidade do público, faço o que senti naquele momento. Não se deve categorizar os públicos. Cada um de nós é diferente. É singular cada pessoa que visita o museu. As obras também diferem na relação com o espaço. Não precisa se preocupar com o público, eles são capazes de se relacionar com qualquer coisa, com o mundo.
Celso Martins: Stela, qual é o maior erro que se pode cometer em mediação?
Stela Barbieri: É você não estar presente. É você fazer automaticamente ou você não se preparar. Tem que estar presente, de corpo e alma. Estar para a vida. O maior erro é não estar presente.
Celso Martins: A arte contemporânea com a sua multiplicidade de formas põe um problema acrescido a essa mediação?
Stela Barbieri: Eu teria mais problema com arte sacra. Nunca trabalhei num museu histórico. Num museu histórico você tem que tornar um trabalho histórico contemporâneo.
Ricardo Jacinto: É articular a presença com o processo criativo e a vida, a relação com as próprias obras?! E esse reconhecimento vem. Quanto mais aquele objecto tiver mistério, capacidade de resistir, para mim, mais certo ele está. Mais convicção tenho daquilo merecer ganhar uma convivência com pessoas, espaços… A questão reside em como articular o erro com o controle. Concordo com a Stela relativamente à presença. Há peças que fazes que antes de serem colocadas já estão mortas, mas às vezes as pessoas ressuscitam-nas. Depende muito do envolvimento. Envolveres-te com esse acto para a coisa não se esvaziar.
Celso Martins: Ricardo, tens trabalhado com várias pessoas. Como vives/tratas essa questão?
Ricardo Jacinto: Isso é a parte importante de colaborar. Quem gosta de viver esse conflito latente. Tens que gostar de te relacionar com os outros, tens que articular. Tudo o que nasce de uma colaboração, nasce disso. Depende das equipas, depende das pessoas.
Celso Martins: Isso mata?
Ricardo Jacinto: Às vezes mata.
Celso Martins: Viver no conflito pode matar o trabalho?
Ricardo Jacinto: Sim, pode.
Do público, Jackson Ribeiro (Brasil) conta uma história de uma escultura intitulada “Porteiro do Inferno” e toda a polémica que a escultura causou pelo seu nome. O nome da peça ganhou um significado. Antes de se saber o seu nome passava despercebida, mas quando as pessoas souberam o nome e a viram colocada perto da Igreja, ninguém a queria lá. Gerou uma grande polémica que envolveu os media. Então, até que ponto tem erro ou acerto nesse processo?
Celso Martins: Nesse caso, o público fez a peça e a peça foi activada pelo público.
Da plateia uma pessoa intervém e considera que o público se ligou a uma coisa muito mais forte que o objecto. Onde cabe isso? Onde está o erro se as pessoas consomem arte? E será que há erro nisso?
Celso Martins: O objecto traz a ideia, as pessoas fugiam da peça porque ela tinha o diabo dentro dela, uma peça numa sala não existe como obra se as pessoas não a virem. No lugar certo, o “Porteiro do Inferno” acendeu qualquer coisa. Uma obra de arte transporta uma ressonância.

E o tempo para o debate acabou.

Felisa Perez
 
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Felisa Perez - Comentário ao Workshop de Helena Marujo

Relato Workshop Helena Marujo|15.12.

Erros morais: novas expansões para os nossos multiversos
Psicóloga, investigadora e professora, Helena Marujo anda por ai a contagiar o mundo com o que se faz no mundo para um mundo melhor. E atrevo-me a dizer que o seu sorriso basta para que isso aconteça.
A proposta de hoje partiu de brincar às escondidas para descobrir os nossos erros (escondidos debaixo das cadeiras). Um deles, de resto, teimava em não aparecer.
Erros descobertos:  
Erro 1: Pecámos contra a esperança
Erro 2: Vivemos no pânico de quem não tem, não é
Erro 3: Vemos o outro como uma ameaça e não como uma promessa
Erro 4: Desequilibrámos os valores
Erro 5: Vivemos seduzidos pelo apego à comodidade do conhecido
Erro 6: Erro das conquistas tangíveis, do viver à procura do fim das coisas
Erro 7: Viver parando é uma espécie de ideologia romântica
Erro 8: Temos a felicidade como projecto individual, foi assim que adoecemos
Cada erro continha uma frase associada, de Jorge Luis Borges a Emily Dickinson. As frases foram lidas e comentadas entre todos.
De seguida, saltámos para o palco (felizes da vida porque a Stela nos deu um pião). Pusemos o pião a girar e toca de dar voltas à cabeça.
Procurámos um par (sempre diferente) para conversar sobre:
1. O que é que nos apaixona neste momento na nossa vida?
2. Um erro divertido que testemunhámos
3. Um erro que deve ser ensinado
4. Quem ou o que é o anjo da guarda dos nossos erros?
5. De que maneira já conseguimos ser anjos da guarda de alguém?
Como não pude estar em todos os grupos (e também queria brincar) vou partilhar os meus erros e os dos meus pares (espero que eles não se importem).

1. Viver. É o que me apaixona neste momento
2. O erro da Diana Tavares que dia sim, dia não, guarda a mala no frigorífico
 3. A mentira piedosa, às vezes “convém” (para os pais sobretudo)
 4. O anjo da guarda da vida do Luís Miguel Neto é a sua “consciência”. Concordo, mas tenho mais um, a minha irmã mais velha, a quem confesso tudo o que faço
5. Já fui anjo da guarda. Como? Conversando, protegendo, omitindo, evitando que alguém actue impulsivamente
Depois destas confissões individuais, juntámos 2 pares e tirámos um erro à sorte. Entre 4 pessoas conversámos sobre esse erro e como tornar esse “microinferno” num “microparaíso” na nossa vida?
Surgiram várias reflexões e propostas. E um grupo, mais politizado, formou um partido:
O FME - partido para a Felicidade, Mudança e Esperança.
Aqui para nós, o meu microparaíso foram estes 3 dias luminosos, cheios de pessoas maravilhosas.  Obrigada

Felisa Perez
 
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Felisa Perez - Comentário às conclusões apresentadas das mesas redondas sobre Ética

Resumo mesas Ética|Equipas 10h

Rosário Azevedo (ICCOM-CECA) tomou a palavra e trouxe-nos as reflexões lançadas nos dois de debate das mesas-redondas sobre Ética. Começou por afirmar que não chegaram propriamente a conclusões, mas a pontos de referência importantes que demonstram que há muito trabalho por fazer e pouca bibliografia sobre a questão. A pergunta de saída foi a tentativa de encontrar sinónimos para os termos de “mediação e ”mediador”, onde a ética está implícita. Falou-se em “facilitadores”, termo redutor, pela dualidade inerente entre fácil/difícil. E se o professor será também um “mediador”? E o mediador será “intermediário” ou “catalisador”? Chegou-se então à conclusão que a dificuldade de encontrar sinónimos para o termo está associada à ambiguidade do papel do mediador, onde cabem uma série de competências e valências, definidas por cada um de nós. Espaço reflexivo e mutante, onde a ética está em permanente construção.
Mais tarde, falou-se da “isenção”. Será que o mediador deve ser isento? Consegue? Não consegue? Entre todos, alguém disse que ele está no meio do processo, logo, tem que tomar uma posição e assumir a posição que toma. Tem que direccionar, orientar, mas o processo fica em aberto, desenvolve-se na horizontal. Outra questão debatida foi o carácter dialéctico da mediação, relacionada à impossibilidade de isenção a que o mediador está sujeito. O processo vai então viver desta dialéctica, onde o mediador vai direccionar, orientar, sem isenção. Neste contexto, a conversa chegou a dois conceitos importantes, trazidos pelos oradores dos dias anteriores: o mediador como “fazedor de circunstâncias” (Fernando Hernández) e o mediador como “construtor de pontes” (John Falk).
Tomou então palavra Elisa Marques (GAM) para nos falar sobre Equipas e a primeira conclusão apresentada foi que o tema teria de ser tratado em relação com os outros dois E’s: Ética e Erro, porque não há equipa sem ética, ética sem erro e equipas que não errem. Percebeu-se também que não há equipa sem projecto e tratou-se o projecto como uma construção, uma imprevisibilidade, excentricidade, intencionalidade e um desafio (nunca um somatório de actividades). Então, se há projecto, venha a equipa. O que é equipa? Um conjunto de pessoas, portadoras de vários saberes (multidisciplinar), que trabalham para o mesmo fim. Considerando uma equipa de mediadores e os factores que interferem na mediação (intrapessoais, instrumentais e simbólicos) lançou-se a questão: Para que serve a mediação? Para levar as pessoas a pensarem outros mundos, alargar conhecimentos e ampliar visões sobre si próprios. O que é essencial para uma equipa saudável? Motivação. O que só é possível, – segundo as conclusões das mesas – com normas, autonomia das pessoas que a constituem, vontade de aprender, capacidade de aceitar o erro, escutar e com prazer no que se faz. Abordou-se em seguida a questão da liderança. Deve a equipa ter um líder? Sim. Uma liderança eficaz. E como pode ser o líder? Autoritário, laissez-faire/laissez-passez ou democrático? Depende do contexto. Deve atender aos propósitos que a equipa tem, ser capaz de motivá-la, coordenar, organizar, desenvolver, planear e avaliar.
A mesa lançou então a pergunta de partida deste encontro: “Em nome das artes ou em nome dos públicos?” Concluindo que uma equipa trabalha em nome da educação em geral, sem pontes, porque não há margens.
Para terminar, Elisa Marques deixou-nos uma frase de Agostinho da Silva:
“Só uma actividade complexa conseguia ser na realidade criadora”.
Colocando-se “em nome dos públicos”, Fátima Alves (GAM), depois de uma breve apresentação sobre a actividade do grupo que integra, o Grupo para a Acessibilidade nos Museus (GAM), lançou a reflexão sobre o que estamos a fazer para os públicos com necessidades especiais? Pensamos neles? E parece que nas mesas alguém terá partilhado uma experiência onde, apesar do museu ter criado actividades direccionadas para aqueles públicos, elas não tinham resposta. Porquê? Porque não houve a ponte, a relação, não se foi ter com eles – refere Fátima Alves que defende ainda que é preciso ir para o terreno, procurar essas pessoas e proporcionar-lhes experiências que motivem o seu (re)encontro com o museu.
Paula Figueiredo (Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa) partilhou, então, uma dificuldade muito pertinente sentida no seu trabalho, a ausência, por vezes, de uma equipa preparada para trabalhar com esses públicos. O debate saiu da mesa e o público partilhou as suas experiências. Sem dúvida que, nesta matéria, há todo um caminho a percorrer. E partilho convosco, neste relato, um programa de referência nesta matéria, o projecto da Pinacoteca de São Paulo (Brasil) que, além de ter uma exposição sensorial permanente (2º Piso) para portadores de deficiências visuais acompanhado por percurso áudio (iPod), conta, entre a sua equipa, com colaboradores também eles portadores de deficiências auditivas (e outras) que fazem a “mediação” desses grupos.
Retomando a questão das equipas e dos professores como mediadores, Joana Andrade (que desenvolve um programa artístico na UNESCO) lançou duas reflexões: o papel das curadorias nos museus e a questão de muitas vezes os professores, quando acompanham um grupo, ficarem à margem da visita. Até que ponto os curadores são envolvidos nas equipas dos Serviços Educativos, onde, segundo a Joana, ainda existe uma grande barreira de comunicação; e como motivar os professores a não acompanharem meramente um grupo. O ICCOM refere que estão a ser desenvolvidos vários projectos nesse sentido e pede a uma representante do Museu Abade Baçal para partilhar o seu projecto.
Robinson (Brasil) traz a sua opinião para o debate, considerando que todo o mediador é educador e que só faz sentido a escola ir ao museu quando integrada num programa/projecto de longa duração. Para Robinson, o mediador não é um guia que vai transmitir informações, vai assumir um papel de formação e gerar conhecimento.
Na linha do comentário da Joana, sobre o diálogo com as curadorias, partilho uma experiência desenvolvida pelo Núcleo Experimental de Educação e Arte do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (NEEA-MAM RJ). No MAM, antes da inauguração de qualquer exposição, o curador debate com o educativo o sentido das obras e o(s) artista(s) estabelecem diálogos com os educadores  para, em conjunto, criarem possíveis leituras da exposição.
Fica o desafio.
Por Felisa Perez
 
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Felisa Perez - Relato do Workshop 2º Dia (10h - Pequeno Auditório da Culturgest)
ENCONTRO – A ARTE DE ESTARCOM 
Workshop com Sofia Neuparth e Graça Passos

Um dia, enquanto dançava, a Sofia Neuparth descobriu que “o corpo é um acontecimento, não é um dado, não é um facto, é um acontecimento”. “E se há estrutura que desenhe esse movimento, é o c.e.m. – centro de movimento que está sempre em transformação, em questionamento, em mudança”. Foi dessa necessidade de questionamento, de procura constate de DEFORMAR, e não de transformar, que partiu o primeiro exercício da manhã de hoje. Para os que ainda piscavam os olhos de sono e achavam que a almofada era para dormir mais uns minutos, enganaram-se. A almofada era mais um ingrediente para uma sopa que nunca está pronta. Para trocar, movimentar, sentir, partilhar.

Depois, duas palavras foram lançadas: “começar”; “sem saber”. E uma questão: “Porque estamos sempre à procura de momentos lógicos na nossa vida?” - Porque temos 10 chamadas para atender no telemóvel quando voltarmos ao nosso lugar? Ou 20 e-mails para responder ao chegar a casa? - Então vamos ESTARCOM. Estar com a almofada na mão, trocá-la com alguém, andar de um lado para o outro, fazer espirais (de dentro para fora e de fora para dentro). Meros pretextos para explicar o que não é explicável. Sente-se.

Filosofia de vida que o c.e.m. segue à risca e que nos entra pelos olhos adentro com o olhar penetrante e profundo da Sofia. E então nasce o diálogo, a conversa, o cruzamento de experiências e vivências pessoais que, quando transpostas para um colectivo, geram inquietação. Nasce a vontade de cruzar.  

Passados alguns minutos, voltou-se à sopa e da metáfora das “batatas” fomos parar ao tricô. Acções mecânicas, que fazemos sem sequer pensar nelas e que podemos fazê-las à conversa com… Seremos então multifacetados? Outra pergunta lançada e que desembocou numa reflexão sobre rotinas. Mas se as rotinas forem transpostas para o nosso campo de trabalho enquanto educadores de museu, artistas, professores, visitantes, ou simplesmente pessoas, a vida perde o sal e a sopa fica insonsa. Para evitar que isso aconteça urge continuar às voltas, cruzar experiências, espaços, tempos, relacionar saberes, estabelecer redes, ter energia, muita disponibilidade, capacidade de escuta e trabalhar para/em comunidade. É isso que estruturas como o c.e.m. e encontros como “Em Nome das Artes ou Em Nome dos Públicos” proporcionam.
Palmas para eles.

Felisa Perez

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Felisa Perez - Relato do Workshop de ontem (10h - Pequeno Auditório da Culturgest)

ENCONTRO – A ARTE DE ESTAR COM
por Sofia Neuparth e Graça Passos

Não faço ideia se as pessoas que andaram às voltas no palco da Culturgest esta manhã estavam a meditar nas encarnações de Shiva, nas histórias da criação do Ganesh ou no último avatar de Vishnu. Sei que, em meia dúzia de minutos, a configuração de uma sala mudou. Mudou porque mais de 100 pessoas foram capazes de sair da sua zona de conforto para parar, pensar, voltar a andar, calar e observar. E numa sintonia quase perfeita, em jeito de performance, lançaram os ingredientes para uma sopa "saudável" e "saborosa". Para quê? Para fazer tremer o palco? Para estabelecer o meio-caminho para qualquer coisa? Pelo desafio da mudança que a reflexão sobre o encontro possa motivar? Ou simplesmente pela “Arte de Estar Com”? Não sabemos porque o nosso corpo é como uma Pedra d’água, tão leve e tão pesado ao mesmo tempo que só através da libertação é possível transformá-lo. Fica o desafio lançado pela Sofia e pela Graça.

Por Felisa Perez


5. MARGARIDA SARAIVA

Margarida Saraiva - Comentário à Palestra de John H. Falk

Visitors NEEDS!

Comentário à palestra de John H. Falk por Margarida Saraiva

John H. Falk para responder à questão Why do people come to museums?  propõe a seguinte classificação de motivações pessoais:

Explorer
Facilitator
Experience Seeker
Professional-Hobbyist
Recharger
Cultural Affinity
Respectful Pilgrim

Na verdade, o que John H. Falk apresentou hoje não oferece nenhuma novidade relativamente ao que dele conhecemos através de livros e artigos.

Gostava de levantar algumas questões:

How do you define needs?
What about the social role of the museum? What about moving beyond needs? What about social transformation? Change? Intervention?
Should we offer people exclusively what they need?
What is the purpose of offering people exactly what they need?
Are we looking to increase the number of visitor or to something else? Or eventually both?

Agradecimentos

Agradeço novamente à Raquel Arada, ao orador John Falk, e à Culturgest.

Margarida Saraiva

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TRANSGREDIR, TRANSGREDIR, TRANSGREDIR….
Comentário à Palestra de Fernando Hernandez por Margarida Saraiva

”É preciso transgredir!”. Eis a principal mensagem da palestra de Fernando Hernandez!

Foi exactamente em tom de transgressão que se iniciou a palestra. ”Fala-se muito em MEDIAÇÃO, mas eu tenho muitas dúvidas sobre o termo e dúvidas que me inquietam!”, disse o orador.
 “A arte expressa relações e não essências!”. O trabalho do educador, e não do mediador, é  “permitir que relações  tenham lugar, é permitir que se criem relações com a obra, trata-se de um processo relacional”.
O educador tem de ser um “criador de circunstâncias” e CRIAR ENCONTROS. Entenda-se que todo o verdadeiro ENCONTRO É TRANSFORMADOR. Se não for transformador não terá sido um encontro. Mais, o significado do encontro poderá evidenciar-se muito tempo depois deste se ter realizado.

”Ir a um encontro é aprender algo de mim”, afirma Fernando Hernandez.

Torna-se então necessário repensar todo o sistema de relações que se estabelece no contexto do Museu.  ”O educador não pode proceder de forma fragmentada, linear ou descontextualizada”. É preciso um certo activismo social, gerar actividades impensáveis, criar mudança, surpreender, estabelecer ligações... É necessário ajudar a lançar constantemente questão: Que tem esta obra que ver comigo?

Fernando Hernandez entende o museu como espaço performativo, no qual a educação surge indissoluvelmente ligada à construção de identidade pessoal. ”O trabalho pedagógico é criador de identidade. Você é um criador!”, exclama.

Fernando Hernandez, na esteira de outros educadores, defende as vantagens da adopção de “projectos de trabalho”, por considerar que favorecem:
- o desejo de aprender
- o diálogo
- a problematização e o questionamento
-  a meta reflexão
- a construção de relações e associações
- documentar (como processo de investigação) e narrar

Já na fase de debate merece destaque, na minha opinião, a intervenção de Samuel Guimarães, questionando a actual tendência para se valorizar quase exclusivamente o trabalho com comunidades, em detrimento do trabalho com escolas.

Fernando Hernandez respondeu dizendo ”As comunidades são como um fantasma. Ninguém sabe bem o que elas são”. ”A Escola conserva potencial transformador e é preciso depositarmos nela a nossa confiança”, acrescentou.

Veio-me à memoria uma obra que está em exposição no Museu de Serralves ”The dedicated followes of fashion!” de Eduardo Batarda, que faz alusão a uma música com o mesmo titulo.

Aqui fica o link:
http://www.youtube.com<http://www.youtube.com/watch?v=xXpkt6revK0>/watch?v=
xXpkt6revK0<http://www.youtube.com/watch?v=xXpkt6revK0>

Numa óptica Deleuziana ”l’art c’est ce qui résiste, c’est ce qui résiste et c’est être non pas la seule chose qui résiste, mais c’est ce qui resiste...”. Fernando Hernandez defende que é possível educar artisticamente.  É nesse sentido que me é particularmente querido o ENCONTRO que hoje estabeleci com Fernando Hernandez.
Subscrevo que é preciso TRANSGREDIR, TRANSGREDIR, TRANSGREDIR….

Agradecimentos

Agradeço ao professor Fernando Hernandez pela fantástica palestra e pelas horas de debate.

Agradeço também à Raquel Arada o convite para comentar estas palestras e organização da conferência.


Margarida Saraiva




6. PAULA FIGUEIREDO 


Paula Figueiredo - Comentário da Palestra de Stela Barbieri

Relato da Palestra de Stela Barbieri 
A empatia com Stela Barbieri é imediata e inquestionável. A pessoa dá-nos tanto com tão pouco. A redução ao concreto, ao vivido, ao sentido, ao simples é-nos oferecido tão generosamente que não devo errar muito se dizer que todos os presentes também “querem ser como a Stela quando forem grandes…”.
O relato da sua história de vida, em pequenos episódios, de uma vivência também sentida pelos que ouvem (por mim de certeza!) por analogia, e porque todos nós entendemos o mundo melhor quando nos referenciamos nos exemplos dos outros, que no caso de Stela nos fez recordar as pessoas e os locais, nada têm a ver com os serviços educativos, mas com o que nos fizeram gostar de trabalhar neles. Talvez este breve momento, este “acaso” nos tenha reposicionado e levado a pensar que o trabalho educacional dentro do Museu seja afinal tão simples como respirar e que a nossa pesquisa e o nosso projecto de trabalho com o público deva ser orientado por aquilo que sentimos, o que julgamos poder estar bem, mesmo que erremos, vale a pena tentar. Nunca pondo de parte a informação que também é importante. Tal como Stela fez quando nos apresentou textos de autores incontornáveis, alguns clássicos, mas ainda muito pertinentes, e questões que orientaram o seu discurso e o nosso pensamento.
Para Stela Barbieri o ERRO é o coeficiente artístico – aquilo que acontece, o desvio, o que não está no nosso controlo (Duchamp, O ato criador). A dualidade é muito redutora. Existem nuances. O coeficiente artístico põe-nos em movimento, tal como as crianças, que de um modo maravilhoso, não param. As crianças trazem ao museu vida e nos colocam em suspensão.
No início da palestra é apresentado um pequeno vídeo com pequenos piões (aqueles que rodam com o movimento simples dos dedos e não necessitam da perícia da corda) numa sequência de imagens “lindas e frágeis”, fazendo pequenos círculos. O círculo como centro do movimento. Se alguma coisa em nós não tem movimento algo está errado – “Eu não sou da teoria, sou da prática”. Olhar com simplicidade, deixar ser o que as pessoas são, sem complicar, foi afirmado pela oradora. Para falarmos da obra temos de nos movimentar para a obra ter movimento.
“O verdadeiro tesouro do homem é o tesouro dos seus erros, a larga experiência vital decantada por milénios, gota a gota.”
José Ortega e Gasset
Stela Barbieri deixou-nos perguntas, frutos do seu trabalho educativo na 29ª Bienal de São Paulo, ao longo do discurso.

·      Como a arte pode mudar a vida?
O educador tem um papel renovador, não um papel de redimir, tal como nos falou Samuel, noutra oportunidade. Quando um “show” nos faz voltar a casa de “alma lavada” é um momento de transformação profunda. Com Sartre como pano de fundo, refere Fernando Hernández quanto à escuta: “Ouvir a obra e as pessoas” – Desnudar a obra é muito difícil. Se os artistas são generosos porque encaram o mundo, o nosso papel é darmos o nosso tempo para pensarmos e por isso precisamos do fluxo da liberdade mas também da paragem da conservação. O nosso papel é dialogar, é estar atento e em simultâneo dar informação. É como o pião em equilíbrio, temos de nos manter em movimento, mas sempre em equilíbrio.

·      De que é feita a memória?
Stela Barbieri relata-nos uma experiência encantadora vivida na infância com uma avó (que afinal era tia, adoptada como avó) no seu ateliê “careta”, onde se cruzavam mais duas tias (uma que ensinava ginástica, mas que não fazia nem um abdominal e outra que ensinava francês e cantava com um chapéu de chuva aberto) e outras crianças que “bagunzavam”, dizendo que elas foram o seu universo de aprendizagem pedagógica, mais rico do que a escola: “Aprendi com as velhinhas a maravilha de ser professor.”
Da cadeira de baloiço apresentada na projecção da sua comunicação, diz-nos ter ficado no “balanço” a pensar, a fazer filmes, referindo que tinha sido a bisavó a ensinar a balançar – “foi este momento que me salvou!” Para Stela, hoje as crianças têm uma vida atribulada e não têm tempo para pensar, tem de haver silêncio, mas com sentido.

Quanto aos públicos, diz-nos que a tendência é a de classificar, mas não podemos engavetar tudo. Ninguém sabe o quanto podemos surpreender.

·      Quando você enxerga algo do outro de você?
“Quando eu estou com as crianças, eu me enxergo nelas. Elas acreditam na voz do impossível. As crianças tentam esvaziar o mar com o balde!” – diz-nos Stela.
Daqui parte para o relato da sua vivência académica, entre vários erros, tornou-se professora por acaso. Entre o jornalismo e a pedagogia não concluiu os estudos.

“A imaginação nasce da mesma região da alma onde nasce a memória.”
Aristóteles
“A imaginação é o lugar onde chove ideias e tens de as aproveitar”– refere Stela. Por isso não podemos ficar isentos, precisamos de apresentar as nossas questões ao público. E qual é o tempo que temos para imaginar? Temos pouco. Deveríamos ser pagos para pensar, para balançar.

“Ser tocado afetivamente e ser tocado corporalmente”.
Sara Paín
“Todos somos educadores, tal como disse um meu conterrâneo, desde o segurança à senhora da limpeza.” O nosso corpo é o nosso veículo.

·      Como você vê o que você vê?
“Eu acho que nós escolhemos para onde olhar, mas temos limitações.” - Susana Gomes da Silva acrescenta que quando questionamos sobre o que as pessoas vêem podemos orientá-las para verem outras coisas. A metáfora do espelho, na qual gostaríamos de olhar e ver outro diferente, revela a nossa incoerência. Podemos pensar que podemos mudar, ver com movimento o que se vê.

·      O que faz a arte ser arte?
Tem a ver com a infância, a imaginação que permite fazer um avião voar que não voa efectivamente. “O meu jeito “meio-torto” fez com que insistisse, batalhasse para fazer acontecer.” Não podemos aplicar um método. Que caminhos os espaços inventam? Os espaços falam deles! Os caminhos que os espaços inventam são diferentes.

Stela Barbieri revela que quando foi para a Bienal de São Paulo, apesar de não ter os requisitos exigidos, fez um curso de história de arte e começou a trabalhar com crianças. Na altura julgava “nadar de braçada” na arte contemporânea, mas percebeu com uma experiência de trabalho que esta pode ser NADA para uma comunidade do interior que vivia ao pé de uma floresta. Num exemplo dado, de recolha de sementes com os habitantes, Stela ensinou-lhes que uma árvore pode ter um tronco amarelo e folhas vermelhas – para mim, esta experiência é uma excelente referência para a educação informal, com a simples ideia de revelar a simplicidade da natureza e não seguir os caminhos rígidos da representação. Não esquecendo o que a Stela nos deixa do debate de ideias com a audiência: “Os curadores podem julgar o nosso trabalho, um trabalhinho, mas hoje já começam a estar abertos. Mas nós temos de fazer um trabalho de colaboração que precisa de estar claro. Muitos somos inflexíveis, temos de ser flexíveis no nosso trabalho.” 

Por Paula Figueiredo




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Debate/palestra de Fernando Hernandez, 13 de Dezembro de 2011, 15 horas


Num encontro quase perfeito entre audiência e Fernando Hernández importa referir, em traços gerais, as questões pertinentes, as sábias experiências de trabalho e o diálogo feliz que se travou na sessão de debate. Perante a ausência de identidade dos intervenientes (também pertinente por provar a permeabilidade dos temas sentida pela maioria dos presentes) gerou-se um ambiente de cruzamento de relatos donde emergiram temas cruciais ao questionamento da mediação cultural.
Da palestra proferida no período da manhã por Fernando Hernández ficou a figura do CRIADOR DE CIRCUNSTÂNCIAS, que conduz subtilmente o outro a encontrar a sua própria criatividade. Sem que seja impositivo, esta figura transgride os cânones académicos, deixando de ser um transmissor de conhecimentos, que fala e parece gostar de se ouvir, para ser o educador – aquele que conduz o outro no seu próprio caminho da descoberta criativa. Será esta a chave para mudar a escola?[1] – Ainda sem resposta, o orador mostrou o ENCONTRO num compromisso de dois indivíduos, no qual algo acontece de importante, repercutindo-se na estrutura do indivíduo que é conduzido pelo CRIADOR DE CIRCUNSTÂNCIAS. O ENCONTRO é o ponto nevrálgico da pesquisa entre alunos e professor.
O relato de uma experiência revela um projeto desenvolvido pelo orador e os seus alunos de Belas Artes, no qual o tema de pesquisa foi simplesmente a ausência, ou seja o silêncio, provocado por um questionamento do professor aos alunos sobre o que haveriam de pesquisar. Indo ao encontro da curiosidade dos seus alunos, conseguiu motivá-los e envolvê-los num projeto criativo multifacetado.
Deste modo, Fernando Hernández apresentou três modos de pesquisa:
1.     Pesquisa Criativa.
2.     Pesquisa Artística.
3.     Pesquisa Social e Humana (mais tarde dirá ser a fundamental das artes, a que permite ver o que a científica não permite).
Do questionamento sobre a pesquisa surgem também modos de relação do artista com a escola. No primeiro, o artista necessita da escola para construir o seu projeto, no segundo o projeto constrói-se na escola, no terceiro a escola quer desenvolver um projeto com a colaboração de um artista numa perda de autoria artística, rara de se ver. Por fim, o artista e a escola podem juntos desenvolver o projeto.

O museu pode ser o lugar para fazer projetos. E esse lugar é o ponto de ENCONTRO. Das escolas fica uma discussão em aberto sobre se serão ou não comunidades. Umas são, outras não. Quando há uma hierarquia perdem-se as responsabilidades partilhadas, que para o orador devem existir numa comunidade. Mas o que é uma comunidade? – Se questionássemos as escolas não chegaríamos a um consenso.

Perante a troca de algumas experiências de uma audiência bem conhecedora da realidade escolar (ou comunidade escolar também ponto de questionamento), o orador refere as muitas brechas deixadas pelo sistema político que nos dão oportunidades criativas de trabalhos numa resposta à falta de recurso e falta de condições de trabalho.
E, se em Barcelona há artistas que fazem projetos na escola, há também uma falha na prática formativa dos mesmos.
Fica então a noção de que a arte é um conjunto de RELATOS, dando o exemplo de Miró, que muito mudou o seu modo de relatar. Para o RELATO da cultura a biografia é essencial: como os indivíduos relacionam o seu relato com a sua biografia.

Nos museus o que se oferece é a informação: “E o que tem a ver a informação comigo?” – diz Fernando Hernández. Nem no museu nem na escola há reflexão, só informação.
Em Portugal, é referido por alguém da audiência, que existem comunidades em algumas escolas, muito pelo trabalho individualizado de alguns professores e nos museus, acrescentou outra pessoa[2]  que também há uma clara mudança nos Serviços Educativos, na qual se convoca as oportunidades de ENCONTRO, num breve momento que pode durar só uma hora, mas que provoca uma mudança importante, referindo o facto de ter uma equipa de CRIADORES DE CIRCUNSTÂNCIA.
Daqui também surge a palavra como armadilha, como algo no qual  estamos enredados  - “não há melhor prática que uma boa teoria”, como salienta o orador.

Por fim, refira-se a imaginação pedagógica (o anjo perdido!), agora ausente das escolas. Para Fernando Hernández, o melhor material didático é o que se constrói com as crianças, não são os manuais escolares. Devemos ativar a imaginação pedagógica, não podemos viver sem utopia.
Quanto aos adultos, não têm tempo nem paciência, ao contrário dos idosos que facilmente partilham as suas histórias de vida, tal como refere num exemplo passado na Catalunha, no qual um grupo de idosos se predispôs a filmar os seus relatos. Da Austrália refere um Centro sem acervo que todos os anos faz uma exposição sobre a história de vida dos habitantes e que assim consegue reunir um grande arquivo de histórias de vida.

Do debate saem reforçadas as ideias anteriormente apresentadas na palestra, assentes no indivíduo participativo com o seu RELATO num diálogo analítico e criativo, que problematiza e que questiona o que no ENCONTRO com o outro emerge, numa mudança constitutiva do seu modo de relatar.

Fernando Hernández deixou-nos também três interrogações (apresentadas como pano de fundo ao debate):
·      Como podemos contribuir para que o museu seja um espaço performativo?
·      Como fazer com que as exposições possibilitem estados de encontro?
·      Como possibilitar e estar atento às “rotas” de leitura dos visualizadores emancipadores?

Em tom de conclusão não conclusiva ficamos com estes questionamentos num trabalho com o público cada vez mais exigente.

Paula Figueiredo




[1] A pergunta veio de Porto Alegre, Brasil.
[2] Susana Gomes da Silva, CAM/FCG.




7. MARGARIDA MELO 

Margarida Melo - Comentário à palestra de Fernando Hernandez

“Transitar entre el museo existente y el museo (im)posible en tiempos de espectadores emancipados.” – Fernando Hernández

Através da apresentação de alguns projectos educativos de colaboração entre escolas e museus, nos quais esteve envolvido nos últimos anos, Fernando Hernández convidou-nos a (re)visitar algumas ideias-chave que fundamentam a sua abordagem pedagógica.

Desde logo enunciados no título da sua palestra, surgem dois conceitos que lhe interessou prontamente clarificar. A ideia de ‘museu (im)possível’, enquanto espaço de possibilidade para práticas museais de ‘encontro’; práticas que abram caminho a novas e diferentes narrativas, que espelhem essas circunstâncias de diálogo(s). Bem como, a ideia de ‘espectadores emancipados’, espectadores portadores de saberes e experiências que não podem ficar à porta do museu.

Num primeiro momento da sua palestra, Hernández apresentou-nos o pensamento de vários autores que têm contribuído para a sua reflexão em torno das práticas educativas e posturas pedagógicas, nas escolas e também nos museus. Entre eles, destaco a ideia, de Maite Laurrari, de arte enquanto expressão de relações. Enquanto criação de linguagens que nos permitem a construção do ‘encontro’.

Papel essencial na construção desse encontro museal, está reservado aos educadores/mediadores, cujo principal desafio é aquilo a que Hernández chama de ‘criação de circunstâncias’. Na explicitação desta genial ideia de educador-criador-de-circunstâncias, Hernández socorre-se da análise Freiriana da concepção ‘bancária da educação’, na qual o ‘educador aparece como seu indiscutível agente, como seu real sujeito, cuja tarefa indeclinável é “encher” os educandos dos conteúdos de sua narração.’ (Freire, 2005: 65)

Assim, ao diálogo comunicativo, de transmissão aditiva, há que preferir o diálogo analítico, aquele que atende aos caminhos de leitura dos que participam de uma conversa cultural. Diálogo que resulte (e simultaneamente decorra) numa narração não fragmentada, não linear e contextualizada.

Aliás, Hernández questiona-se se a expressão ‘mediadores culturais’ não traz, em si, uma ideia colonizadora e hegemónica, contrária à visão, também ela Freiriana, de emancipação dos públicos. Será o mediador cultural o ‘educador que opta e prescreve a sua opção’, enquanto os públicos se limitam a ser ‘os educandos, os que seguem a prescrição’ (Freire, 2005: 68)? Ou, só o é se for esse o paradigma pedagógico em que opera?

No entanto, na minha opinião, a noção de ‘espectadores emancipados’, careceu de um debate mais alargado e crítico. Serão as crianças, alvo preferencial dos projectos de trabalho propostos por Hernández, espectadores verdadeiramente emancipados? Acredito que a metodologia que Fernando Hernández nos propõe poderá contribuir, substancialmente, para a criação de futuros públicos adultos emancipados. Mas, como criar projectos de trabalho pedagógicos, verdadeiramente transformativos, dirigidos aos adultos de hoje? Aos tais que não têm tempo?

Termino com uma das frases de Fernando Hernández que mais ressoou em mim: ‘se um encontro não nos ensina nada sobre nós próprios, então, é um encontro perdido’. Este não foi seguramente um encontro perdido.

Por Margarida Melo


Freire, Paulo (1968/2005), Pedagogia do Oprimido, Paz e Terra: São Paulo: 65
Larrauri, Maite (2000), El deseo según Deleuze, Editorial Tándem



8. SUSANA GAUDÊNCIO 


Susana Gaudêncio - Comentário às conclusões das mesas redondas

Apresentação e síntese das conclusões das mesas redondas Stella Barbieri, Maria Vlachou e ReCoSE  
(Susana Gaudêncio)

Errar é humano, poderíamos afirmar que uma das diferenças entre o Homem e a máquina é a nossa capacidade de tornar o erro produtivo, uma máquina que erra torna-se obsoleta, a capacidade de transformar essa obsolescencia numa coisa útil pertence à criatividade humana.
A utopia é o erro do sistema. O erro produtivo enquanto lugar possível para o impulso utópico – pode levar-nos a uma nova solução, à esperança e desejo de construir um mundo novo, ou diferente.

ERRO:
Falha ou falta da comunicação.
Proposição que fica no vazio.
O contrário daquilo que cada um determina como certo.
Erros pragmáticos, do dia a dia.
Erros sociais.
Erros conscientes e erros inconscientes.

Estas mesas redondas funcionaram não só como um carpir colectivo sobre a lesão, a culpa, o julgamento, a vergonha, a sentença e a negação, inerentes ao erro, mas principalmente  representaram uma oportunidade de reflexão sobre o efeito positivo do erro. Ficou claro que:
“O erro é o principio de muitos grandes sucesso” Maria Vlachou
O erro relaciona-se com o processo mais do que com o sucesso. É uma das suas varáveis.
Podemos identificar erros processuais, erros sistemáticos e erro de avaliação.
Há erros que somos obrigados a cometer. O erro possibilita-nos a distância para
para avaliar melhor o que estávamos a fazer. Aprendemos, ganhamos experiência.
Como detectar o erro quando estamos sozinhos? Qual a nossa capacidade de julgamento em solidão, estaremos mais protegidos do  erro, do que quando em público ou em equipa,? Que sistema nos julga?
Como assumir o erro, e desviar essa tensão? Relativizemos o erro mantendo uma distância objectiva e sem culpa procurar a solução.



Como “ Errar Produtivamente”? Maria Vlachou
Há que perder o medo de identificar e de assumir o erro. Apesar da concorrência, apesar das chefias impacientes.
Como se cria o espaço para a ocorrência do erro produtivo, que é inesperado e por vezes surpreendente? Há que prever o erro, há que arriscar com cautela, há a necessidade de ousadia como catalisadora da transformação.
Preparemos-nos com uma base sólida de conhecimento para improvisar no erro.
Inventemos um “Sistema de erros ”  Stella Barbieri
Sugestão de exercício: Realize o seu curriculum vitae registando os seus erros em vez dos seus sucessos.

  Um sistema de erros é um sistema de fragmentação, que pode proporcionar a ruptura, a inquietação, a viagem do conhecimento.

A Errância”  Stela Barbieri
Na viagem para o conhecimento erra-se e é-se errante, Joseph Campbell diz-nos que ao contrario da jornada errante, a jornada do herói é sem erros, faz parte do Mito e não da Vida.
O erro faz parte da vida e proporciona momentos de deriva,
Sugestão de exercício á luz dos situacionistas: Passear em Paris com uma mapa de Lisboa!
O erro produtivo depende de nós, forma-nos a vida, ensina-nos, provoca desvios criativos ao status quo social, cultural, politico. Prepara-nos para o impulso utópico e dá-nos esperança.

O tema desta Mesa, que não se realizou, prendia-se com a Utilidade de uma rede de colaboradores de serviços educativos no contexto das redes sociais no espaço cibernético.
As suas moderadoras, Susana Alves e Diana Ramalho, encontraram neste Erro uma oportunidade para reflectir com uma audiência maior, através de uma actividade que demonstrou metaforicamente a importância da partilha, do encontro, da rede de interesses desta comunidade. Com dois novelos de lâ, criámos uma teia de pessoas e palavras, mimetizando a actuação brilhante da ReCoSE.
Obrigada a todas!

Susana Gaudêncio


9. RAQUEL PEDRO  


Palestra de John Falk - Imagined vs. Actual: Understanding the Museum Visitor Sessão de debate John Falk e Maria Vlachou
 
Onde começa a prática artística e termina a mediação cultural foi, a meu ver, uma das perguntas que mais inspiraram a conferência, e provavelmente representa um dos dilemas mais prementes com que se debatem os museus/centros de arte contemporânea (domínio em que se insere este relato e análise crítica).
O desafio trazido por John Falk foi um contributo ao conjunto de palestras que a conferência promoveu. Este autor concluiu, através da sua pesquisa, que é possível identificar diferentes tipos de identidades nos públicos que visitam os museus, motivados por uma espécie de agenda pessoal (1).
Falk debruça-se sobre o tema da identidade por considerar que as identidades se relacionam com certas necessidades (2) e que estas são a razão pela qual o público apresenta determinados comportamentos, de certa forma padronizados, face às visitas dentro dos museus. Segundo o autor, através do conhecimento destas identidades, os museus ficariam assim mais bem preparados para receber os públicos. A cada uma destas identidades mencionadas (3) corresponde um tipo de comportamento na entrada, no decurso (trajectória) que se escolhe dentro do museu e na saída. Para Falk importa entender o que as pessoas fazem dentro dos museus e o que levam de lá.
Por outro lado, estas identidades estão relacionadas com diferentes tipos de motivação (e diria eu, a diferentes tipos de escolha). As necessidades levam a tomar decisões e a fazer escolhas, mas se invertermos o sistema, as decisões e escolhas também podem levar a necessidades que julgamos não ter ou que simplesmente desconhecíamos.
Embora a tendência da audiência na palestra fosse mais no sentido de compreender as razões/motivos daqueles que não vão aos museus, Falk procurou, acima de tudo, apresentar informações sobre o tipo de pessoas que frequentam os museus. Neste ponto, poder-se-ia perguntar se falta ensinar a ida ao museu. O sintoma que está por detrás da ausência de públicos nos museus, não será comum a outras instituições ligadas, de alguma maneira, à arte e à cultura em geral?
Com o actual sentido alargado da arte, espera-se que, em particular, as instituições ligadas à arte contemporânea, contrariem a institucionalização, reinventando-se todos os dias; acomodando nas suas vivências relações de respeito e liberdade com os criadores, os profissionais e os públicos. Reformulando constantemente os discursos e as metodologias e adaptando-se às convulsões/transformações da própria sociedade. Ainda assim, foi assinalado na sessão de debate que é preciso aproximar o museu da realidade e quem sabe, alargar os públicos; desde que os museus não esqueçam o sentido da experiência fenomenológica da relação dos objectos com o espectador; não subestimem o público, não deixem cair o efeito de descoberta nos visitantes ou pôr em causa as escolhas livres dentro do museu.
 
(1) Falk refere que a pessoa chega ao museu com uma agenda pessoal - uma série de expectativas que interferem/ determinam a própria visita e que correspondem a motivações. 
(2) Identity-Related Visit Motivations 
(3) Segundo Falk, explorers, facilitators, professional/hobbyist, experience seekers, spiritual pilgrims
 
Para uns, o museu será um farol, para outros será um abrigo, satisfazendo diferentes necessidades. O museu alberga obras multifacetadas e os visitantes são únicos e surgem com estados de alma muito diferentes. Cada pessoa pode experimentar diversos papéis ao visitar um museu, isto é, uma vez ser um explorer e outra vez ser um facilitator. Falk diz-nos ainda que os visitantes trazem motivações relacionadas com as suas identidades e com a tal agenda pessoal. Acrescentando que se as pessoas não vão aos museus, é porque não compreendem que estes espaços podem satisfazer as suas necessidades pessoais. Seria interessante discutir-se um pouco mais de que necessidades se trata. Estamos a referirmo-nos a questões de realização pessoal? Compreender como as pessoas tomam conhecimento de si mesmas ao ponto de terem consciência de todas as suas necessidades não é tarefa fácil. Importa mencionar que Falk teve o cuidado de sublinhar que este conjunto de identidades (características), não nos diz obviamente tudo em relação aos visitantes. Falk refere que a identidade é multidimensional e que o museu é um espaço complexo e dinâmico.
Por outro lado, esta questão levantada por Falk fez-me pensar em que medida projectamos a nossa identidade na ida ao museu. Como se estes espaços representassem uma espécie de palco para a narrativa pessoal. Para além das afinidades com a programação e/ou pluralidade das propostas, factores sócio-económicos, educacionais e outros, na origem da escolha do museu podem estar questões de identificação e semelhança. O processo de construção e reconstrução de identificações faz com que o indivíduo defina o seu lugar na sociedade. São os museus capazes de lidar com estas questões?
Falk determina que estes estudos representam um conjunto de informações que podem funcionar como ferramentas para um melhor desempenho das instituições. Acrescentando que podem servir de reflexão no sentido de inverter ou reformular algumas dinâmicas actuais dos museus. Na minha opinião, seria importante que se olhasse para estas ferramentas essencialmente com fins criativos e não lucrativos. Os estudos significam sempre contributos, pois ao conhecer-se a realidade com que se está a lidar, fica-se mais preparado para decidir e antecipar para onde se quer ir e o que se quer fazer, neste caso, com o museu.
Por outro lado, se os museus estão empenhados em comunicar, e se comunicar é tornar comum, então é na partilha que deve assentar a dinâmica dos museus. Ocorre-me entretanto lembrar José Régio
(...)
Não sei por onde vou, Não sei por onde vou
- Sei que não vou por aí!
Para que as pessoas valorizem a arte é necessário levar as pessoas a uma vivência da própria arte, e esta deverá ser a fórmula a usar no museu, permitindo assim uma maior compreensão dos seus objectivos. O que deve preocupar os museus (e em particular os serviços educativos) é a capacidade de tornar estas instituições, lugares inclusivos. Um museu que encare a diversidade como uma oportunidade, no sentido de despertar consciências e combater qualquer forma de estigma. Os projectos de responsabilidade social podem ser fortes aliados para se construir um verdadeiro sentido de comunidade.
O museu muitas vezes não chega a perceber os efeitos da sua intervenção. É pertinente a noção trazida por Falk do impacto da experiência a longo prazo nos aspectos da própria memória; importante pista para o entendimento da visita, da relação do museu com o visitante e para os aspectos da aprendizagem.
Por último, não devemos esquecer que as acções humanas são afectadas por forças externas, isto é, pelo contexto, situação ou estímulo exterior. Caminhar em conjunto, museu e público (e nunca separadamente) como terá dito Stela Barbieri, deverá ser uma das conclusões desta conferência. Neste sentido, saber quem é o outro, conhecer o outro pode ser um acto inclusivo. Ao procurarmos entender quem visita o museu, abrimos caminho para uma eventual compreensão dos que ficam de fora e com isto criamos condições para os trazer, incluir ou integrar.
 
Fórmula final: Com a Cultura e com o gesto fazemos uma casa do mundo!
 
Agradeço à Raquel Santos Arada o convite para este desafio e à equipa do serviço educativo pela dedicação em tudo o que fazem. 

Agradeço à Culturgest e aos oradores que me fizeram reflectir sobre estes assuntos.

Por Raquel Pedro


 

 

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